Em certo tempo
Deixarão de ter existência…
Todos os locais por onde passei
Deixarão também um dia de existir
As memórias que guardei
E todos os amigos que conquistei
Em certo tempo nada terá o significado que teve…
Não sei o que restará desta presença
Desta incógnita a que chamo vida
Que restará destes momentos?
Que restará de todos estes ídolos?
De todas estas palavras?
De todos os pensamentos…
Será que terão ainda sentido?
Para o meu coração basta só estes tempos
E nada mais…
Pois quando ele deixar de sentir
Será já outra era
Em outro tempo
Serão já outras vidas
Outros recantos e jardins
O ar será outro com toda a certeza
Erguer-se-ão novas estátuas
E novos ídolos nascerão
Outras mãos descreverão o puro sentimento
Que vai eternizando a alma de quem ama
Mas é assim que te quero vida
Porque sendo imortal não saberia
Dar-te o verdadeiro valor que susténs…

Destrói-me a cabeça este contentamento descontente
Ameaçando quebrar tudo o que é visível a estes olhos
Esse turbilhão de ser e não querer
De amar e não ter
Chateia-me este estímulo indiferente
Este mundo inconsciente
Esta vida atribulada inimiga e mundana
Continuamente desesperada
A presença da noite faz de mim um sonhador
Eterno…
Escondido nas asas da madrugada
Continuando a sonhar o mesmo sufocante sonho
Que consome este ar que ainda tento respirar
Como se houvesse ainda algo para inspirar…
Ah… Se houvesse uma forma
Um momento de alcançar o que foi esquecido
Se eu soubesse…
Mata-me e ao mesmo tempo consome-me
Este mundo estúpido
Cruel…
Que se corrompe a cada segundo
Numa orgia imortal de pensamentos inconstantes
E ideias desprotegidas pelo desfalque das almas
Afastando-se lentamente da serenidade de espírito
Essa tranquilidade que uma vez mais tento abraçar
Como se me entregasse a uma fantasia
Ou devaneio…
Não ponderando nesta viagem
Os caminhos tortuosos da extrema indolência humana…

È neste momento…
Agora…
Onde tudo se funde
Caindo na luz…
Onde tudo se transforma
Ergue-se de novo uma nova ausência
Como se quisesse abrandar o final do tempo
Ou tentar equacionar a eternidade
È o tempo dos ausentes…
Distantes do pensamento
Ocultos na verdade
Mal posso esperar por este momento
Já passou tanto tempo que perdi o gosto
Pela fome deste mundo
Este sabor inconstante…
A consciência mudou uma vez mais
Perdi a lembrança deste cheiro
Etéreo…
È este tempo…
Ausente…
Uma fábrica de palhaços
Perdi o sentido desta dor…
Nem sei onde me dói…
Ah…
Dói-me a cabeça deste Mundo…
Onde se perdeu o mapa para a terra da liberdade…
Os cavalos brancos tornam-se histórias de crianças
E estão longe deste mundo cruel…
As batalhas estão presentes
Mas as ameias dos castelos desfrutam ainda do calor da noite…
E do silêncio da Lua…
Alimentam-se ainda do palco dos poetas
E das setas enigmáticas das estrelas…

Sentado neste banco de palha
Olho o meu ser uma vez mais ausente
Embriagado por pensamentos
Sonho ainda acordado e extasiado
Como se a minha alma estivesse por cima desta esfera
Tentando compreender este circo
Existe ainda tristeza no meu olhar
Ausente estou do meu viver
Presente quero estar nesta ausência
Uma vez mais um conflito de gerações
Inconstantes…
Longa está a noite
Nesta madrugada silenciosa
Onde vagueio uma vez mais pela agonia deste sonho
Soltando lá do fundo este grito solene que se liberta
Freneticamente…
E estremece os pilares da minha existência
Perdendo-se no tempo
Sei que nada vou sentir
Sozinho de novo
Vou fazer as malas e partir
Vou subir o céu como um falcão
Tentando desesperadamente alcançar o infinito azul
Vou estar fora por uns tempos
Muito tempo…
Nem os anjos me vão encontrar
Até onde as minhas asas me levarem
Pois odeio esta angústia que se reflecte neste espelho