Quero uma cidade só para mim
Onde possa pintar o teu rosto
E escrever o teu nome
Onde consiga esculpir a tua essência
Quero uma tela só para ti
E um pincel só meu
Para te desenhar no vazio
Quero um quadro de cores incolores
Transparentes na tua simplicidade
Ah… Se eu fosse instrumento por um dia
Perder-me-ia no ultimo acorde
Mas não a quero toda…
A música…
Quero-a apenas no meu universo pessoa
Quero-a na minha valsa
Quero ainda as pedras da calçada antiga
Onde possa delinear o teu sorriso
E amá-lo da minha janela descontente
Quero a chuva na minha tenda humilde
E a noite no meu silêncio inocente
Quero-a…
A poesia a teu lado
Embriagado e extasiado pelo teu perfume
Essa fragrancia de mil noites
Que satisfaz a minha boca
O gosto doce do teu pescoço
Quero ainda a vida…
Para te dar em troca por um beijo suave
Doce ou amargo
Inocente ou violento
Trágico e ardente…
Quero um planeta só para mim
Para redescrever as leis
Que te envolvem na minha galáxia

Quero aquela palavra…
Que se desfaz no momento
Quero-a no meu poema
Na minha frase
No meu sorriso plangente
Aquela que agitada se manifesta no tempo
Quero tê-la aqui tangente
Exprimindo a sua vontade firme e decidida
Quero tocá-la com os meus dedos
E borrá-la no meu papel
Sentir-lhe a fome de ser eterna
Beber-lhe o cheiro…
Quero-a aqui comigo
Junto ao meu aparo
E perto da minha alma
Quero-a picante
Erótica ou camuflada
Amada ou amante
Pintada…
Quero-a toda minha…
A palavra delineada
Saciada…
Alienada ou inquieta
Quero vê-la fugir dos meus dedos
E deixá-la nas paredes
Nos papéis e nas encostas
Escrevê-la na terra e no mar
Deixá-la viva e fresca
Quero-a toda para mim
Palavra que se desfaz e se completa
Toda ela…
Mordaz ou melodiosa
Quero-a na minha vida…

Vamos delinear um poema…
Passa-me o aparo e segura o meu papel
Dá-me uma lágrima tua
Ou um simples sorriso
Com suavidade pinto o teu rosto
Como se quisesse tocar no teu sonho
E desejasse pintar a tua alma
Passa-me o brilho dos teus olhos
E devolve-me essa luz que tentas alcançar
Deixa-me elevar-te neste êxtase de palavras
E dar-te o que é teu por direito
Agora segura a minha tela
E sopra a tua utopia calmamente
Já ninguém morre de amor
Deixa-me então dar-te as palavras
Fui além buscá-las
Para te traduzir este coração que é pequeno
Dá-me o teu beijo e prende-me
Ajuda-me agora…
Agarra a minha mão e descreve-me
Cuidado…
Tenho a meu favor o olhar de quem te ama
Reproduz para ti a minha vida
Porque por detrás da tua sombra
Sou eu que te envolvo
E cada verso contém uma dança
O teu corpo e o meu corpo
Numa valsa alquímica perfeita

Limpa-me esta lágrima
Com o teu olhar
Que é simples e discreto…
Guarda-a no teu sentimento
Como guardaste um dia um beijo meu
E encaminha-a para o teu rosto
Dá-lhe luz
E verás como ela derrete no teu leito
Vê como ela teima em escorrer
Por este rosto que um dia foi teu
Dá-lhe a liberdade que ela te pede
E afoga-a na tua presença suave
Como se tivesses a sensatez
Da presença deste amor
Que ainda derrama lágrimas ao tempo

Ainda me vês…
Cara de miúdo e sorriso inocente
Olhos brilhantes e cabelo louro
Sabes o que ando à procura…
Perguntei pelas portas
Toquei nas paredes
Nuas…
Cruas…
Pintei o meu tempo na tua tela
E sabes que ainda estou aqui
Pertenço ainda ao povo
E sabes que não me desliguei
Lamento ainda este cheiro intenso
Esta sala lúgubre ou este ser não mais presente
Abram a porta e deixem-me entrar!
È o meu grito de loucura consciente…
Não consigo mais sonhar!
O meu pensamento inconsciente que consome ainda este ar
Limpa-me este suor frio
Que me impede de sonhar…
Suavemente nutro este meu sentimento
Quero viver!
Apelar ao sentido mais interior
E fazer dele o trilho deste mapa
Uma vez mais por esta estrada vou caminhando
Ainda desconhecida esta direcção…
Talvez a norte
Ainda assim… incompleto me sinto…
Desprotegido, continuo a vaguear por aí
Saiam da frente e deixem-me passar!
Não quero mais nada senão caminhar…
Deixem-me tombar este corpo alienado nesta terra distante
Sorver esta areia deserta e descrever
Este acto de sentir com o meu aparo
E esta tinta pura
Que passa e perpassa
Neste papel já humedecido pela lágrima tenra
Que caiu e me esconde a razão e o porquê
Como se me consumisse em eterna agonia
Ainda me vês aqui neste teatro…
Aqui prostrado…
Deitado e alienado
Folgado e arrebatado
Demente e perpetuamente apaixonado

E ando pela terra e pelo mar
Tentando desvendar a tua solidão
Talvez a minha mão aberta de dê força
Para me dares a tua companhia
Procuro-te ainda pelas aldeias
Pelas cidades e pelo mundo
Talvez antes de ti…
Eu te encontre aqui…
Difícil é encontrares este momento
Em que eu me dou…
Palpita ainda o meu sangue ausente
Deste corpo diferente
Que viagem será esta…
Por vezes nem reconheço o sabor deste sal
Será que é terra ou mar?
Ando em busca destes sentidos…
Ando pelo céu e pelo mundo
Tentando encontrar o sonho perdido
Sou demente nesta terra de gente
E enquanto a multidão ri
Eu estou distante deste tempo que foge

Sei que sinto
Aquilo que me esqueci
De recordar
Não passamos de sombras
Neste caminho nocturno
As vozes que se ouvem na escuridão
São o som da incerteza
Fazem-me suspirar nestes tempos
E estes sons envolvem-se
Em mim
E choro na escuridão da noite
As minhas lágrimas tocam as flores murchas
Desta terra onde o rio parou de correr
E procuro ávidamente as paredes
Que o mar não derrubou
Para me guiar por este caminho incerto
Em pequenos passos
Avanço sem tocar no oculto
A brisa toca-me no rosto
Até que a morte dá conta do meu desejo

Proíbo-me de te esquecer
Nestas longas madrugadas
Ora conscientes
Ora doces
Mas sempre despertas
Despertas como a luz
Longas como a esperança de te ver
Proíbo-me de te esquecer
Porque só assim
Estás comigo
Na minha lembrança
Ora doce
Ora cruel
Mas sempre bonita
Cruel como a minha estrada
Proíbo-me de te esquecer
E ainda assim me recordo
Que não estás aqui
Nesta madrugada longa
Neste final de noite
Mais uma
Que me leva ao dia
Neste dia infeliz